segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Financiamento Público dos Sistema de Transportes na Bélgica


Há alguns meses atrás assisti a uma comunicação muito interessante do professor Jo Van Biesebroeck da Universidade de Louvain (Lewven) sobre os apoios públicos à indústria automóvel, da qual reitirei aliás alguns elementos que anteriormente aqui apresentei.
Entretanto, enquanto arrumava alguns papeis, reencontrei essa apresentação, tendo-me chamado à atenção os slides onde se apresentam alguns números relativos ao financiamento do Estado (Nacional, Regional e Local) a duas empresas de transporte da Bélgica: De Lijn (entidade responsável pelo transporte público na região flamenga) e SNCB (responsável pelo transporte ferroviário de passageiros).

Os níveis de financiamento a estas duas empresas são particularmente impressivos: o subsídio é de 1,98€/viagem na De Lijn e de 6,72 €/viagem na SNCB, enquanto as receitas tarifárias são de 0,30€/viagem e 0,96€/viagem, respectivamente. Ou seja, em ambos os casos os clientes representam 13% dos proveitos, correspondendo o financiamento público a 87% destes.

Fui analisar também as contas da empresa de transporte público da região da Valónia (TEC) em 2008, tendo registado que, neste caso, as compensações regionais e locais representam 79% dos proveitos, ou seja, os passageiros apenas suportam directamente 21% dos custos de funcionamento da empresa.(1)

Os números apresentados revelam um esforço de financiamento muito elevado por parte da administração pública (80 a 87% dos proveitos das empresas) por comparação a um pagamento de dimensão muito inferior por parte dos clientes (13 a 20% das receitas).

Embora existam razões históricas e de política de transportes que conduzem a este elevado nível de financiamento do sistema na Bélgica (e. g. transporte gratuito para os maiores de 65 anos, descontos para os menores de 25 anos, oferta de transporte por 3 anos aos clientes que vendam o seu veículo, redes de transporte nas áreas de baixa procura, frequência do transporte nos horários de menor reduzida), coloca-se também neste país o problema da sustentabilidade económica do modelo de financiamento, não pelas mesmas razões que em Portugal, mas sobretudo porque o peso nos orçamentos locais e regionais representa um esforço expressivo.

Mas, na comparação entre modelos de financiamento dos sistema de transporte público da Bélgica e de Portugal, para além das diferenças expressivas em termos do nível de financiamento existente, dois aspectos diferenciadores merecem atenção:
  • Na Bélgica está claramente atribuída a competência de financiamento aos governos regionais (excepção feita ao sistema ferroviário nacional, que se mantém na competência nacional), ao passo que no nosso país existe uma situação em que essa questão não está totalmente clarificada, pelo menos no que concerne às áreas metropolitanas;
  • As empresas públicas de transporte belgas apresentam situações líquidas bastante confortáveis, com um grau de cobertura do activo pelos capitais próprios relativamente elevado (79% no caso da SNCB, 44% no caso da TEC), o que conduz a níveis de endividamento relativamente contidos, ao contrário das empresas de transporte detidas pelo Estado Português que se encontram, quase todas elas, em situação de falência técnica (capitais próprios negativos) e com níveis de endividamento muito elevados.
(1) - No caso da STIB (empresa de transporte público da região de Bruxelas) não me foi possível obter informação suficientemente desagregada, mas os dados de que disponho é de que neste caso o nível de financiamento é inferior, o que resultará quer da maior densidade demográfica da capital do país e da área envolvente, quer da menor capacidade financeira que a região capital regista, comparativamente à Flandres e à Valónia.

1 comentário:

PPP Lusofonia disse...

Só há duas fontes de pagamento dos serviços públicos: ou o utilizador-pagador, ou o contribuinte-pagador.
Se as receitas tarifária são insuficientes, tem que entrar o subsídio do contribuinte, actual ou futuro, local ou europeu.

Parece que na Bélgica o contribuinte local vai pagando logo todos os anos. Em Portugal, as empresas públicas esturuturalmente deficitárias vão acumulando défices operacionais e passivo, que terá que ser assumido pelos contribuintes (o Estado) mais cedo ou mais tarde.
Isto causa o efeito "iceberg", pois a Dívida Pública Directa (que conta para Maastricht)é bastante inferior à Dívida Externa Bruta (que conta para o rating).
VER PPP Lusofonia